OSADIA ESTETICA DO
EMILIANO DI CAVALCANTI
Di Cavalcanti era um intelectual bem informado sobre as vanguardas modernistas do seu tempo, interessado não só por artes plásticas, mas por outras áreas também. Por isso mesmo, em 1921, o artista fora convidado a ilustrar o livro “Balada do Cárcere de Reading”, de Oscar Wilde, um dos mais significativos escritores contemporâneos.
Em 1923, Di Cavalcanti realiza viagem a Paris, freqüentando o ambiente intelectual e boêmio da época e convivendo com Picasso e Braque, entre outros, numa relação de admiração mútua. Sua experiência do contato com o cubismo, expressionismo e outras correntes artísticas inovadoras, conjugadas à consciência da sua posição de artista brasileiro, concorreram para aumentar a sua convicção no propósito de ousar e destruir velhas barreiras, colocando a arte brasileira em compasso com o que acontecia no mundo.
Di Cavalcanti sabia estar no caminho certo esteticamente e a viagem a Paris só reforçou as suas certezas. Entretanto, o ambiente do pintor não era o dos boulevares de Paris: Di Cavalcanti estava impregnado dos trópicos, de uma atmosfera sensual e quente.
À sua ousadia estética e perícia técnica, marcada pela definição dos volumes, pela riqueza das cores, pela luminosidade, vem somar-se a exploração de temas ligados ao seu cotidiano, que ele percebia com vitalidade e entusiasmo. A profunda inclinação aos prazeres da carne e a vida notívaga influenciaram sobremaneira sua obra: o Brasil das telas de Di Cavalcanti é carregado de lirismo, revelando símbolos de uma brasilidade personificada em mulatas que observam a vida passar, moças sensuais, foliões e pescadores. A sensualidade é imanente à obra do pintor e os prostíbulos são uma de suas marcas temáticas, assim como o carnaval e a festa, como se o cotidiano fosse um permanente deleitar-se. A originalidade de uma cultura constituída por um caldo de referências indígenas, européias e africanas, de forma contraditória e única, transparece em suas telas através de uma luminosidade ímpar.
Marcada pela evolução constante em direção a uma técnica cada vez mais acurada, a obra de Di Cavalcanti pode ser situada numa tradição interpretativa do Brasil. Hoje, o pintor é um dos mais populares artistas brasileiros, alcançando enorme prestígio também no exterior: suas obras são disputadíssimas nos leilões internacionais, imprescindíveis a todas as coleções latino-americanas. A pintura de Di Cavalcanti representa toda uma imagem do país no mundo afora, ressaltando a sua exuberância natural e humana: é indiscutivelmente figura chave da arte brasileira. Todo o seu entendimento tem passagem obrigatória por Di Cavalcanti.
EMILIANO DI CAVALCANTI
Nasceu no Rio de Janeiro em 1897.
O pintor Emiliano Di Cavalcanti nasceu em 6 de setembro de 1897. Naquela época, o panorama das artes plásticas no Brasil era bastante desolador: a pouca informação, conjugada ao tradicionalismo conservador das elites vigentes deixavam o cenário da pintura a depender ainda de ecos das já ultrapassadas correntes artísticas européias.
Nesse contexto, tornaram-se muito importantes as exposições de Lasar Segall, em 1913, e de Anita Malfatti, em 1917, esta duramente criticada. Esses dois episódios fazem parte da história de um movimento em direção às correntes modernistas européias, que iria culminar na Semana de Arte Moderna de 1922. Di Cavalcanti já era um artista de talento bastante reconhecido nessa época, e sua atuação em 1922 foi essencial: o artista foi um dos idealizadores da Semana de Arte Moderna e uma referência importantíssima para todo o grupo modernista e, desde então, para a história das artes plásticas no Brasil.
Em 1914, a revista Fon-Fon publicou seus desenhos de caricaturas. Matriculou-se na Faculdade de Direito dois anos depois e em 1917, mudou-se para São Paulo, não tendo terminado o curso. Conviveu com Mario e Oswald de Andrade, Tarsila, Anita e Brecheret. Interessado em pintura, frequentou, em São Paulo, o ateliê do pintor George Elpons, um alemão de influências impressionistas. É considerado, entretanto, um autodidata.
Di Cavalcanti foi o idealizador da Semana de Arte Moderna de 1922. Participou de sua organização, fez os catálogos e programas e expôs doze pinturas.Entre 1923 e 1925, viveu em Paris, época em que entrou em contato com Picasso, Braque e Matisse. O Beijo data dessa época, evocando uma atmosfera romântica de sua juventude. Em viagem à Itália, pôde ver os clássicos, que contribuiram para sua formação de pintor. Teve influências, também, de Delacroix, de Gauguin e dos muralistas mexicanos.
Filiou-se ao Partido Comunista e a partir de então, as temáticas sociais e nacionais tornaram-se presentes em suas obras. Retornou a Paris em 1937, onde viveu até 1940. Mulher Sentada, exemplifica grande parte de sua produção, marcada pela temática da sensualidade da mulata brasileira.
Executou vários painéis, publicou álbuns com gravuras e serigrafias, ilustrou livros, bilhetes de loteria e desenhou jóias. Escreveu crônicas e comentários para jornais e revistas. Participou das I, II (prêmio de Melhor Pintor Nacional) e VII Bienais de São Paulo, da XXVIII Bienal de Veneza, além de inúmeras exposições no Brasil e no exterior. Morreu em 1976, no Rio de Janeiro. 100 anos do Nascimento de di Cavalcanti
— “Não sou brasileiro nem português, sou Albuquerque de Pernambuco”, assim se expressaria mais tarde o menino nascido Emiliano —6 de setembro de 1897 apelidado Didi, criado por sete amas de leite, entre saraus e poesias de Castro Alves… infância feliz no velho bairro de São Cristóvão, Rio de Janeiro. Fugidias escapadas à casa do tio Abolicionista José do Patrocínio, casado com tia Bibi, irmã de D. Rosália de Senna, sua mãe. Frederico Augusto, o militar austero, cedo negou ao menino irrequieto a proteção paterna. Partiu sem poder orgulhar-se do rapaz que iniciara a vida artística no ano de 1916, expondo em conjunto no Salão dos Humoristas.
Aquele que se tornaria “glória nacional” idealista e autodidata, expôs individualmente na sede da Revista Cigarra em São Paulo, cidade que juntamente com Paris adotaria de coração como se nelas tivesse nascido.
Em fevereiro de 1922, tomou-se o pioneiro idealizador da Semana de Arte Moderna, galgando o mundo, expondo em Paris, Bélgica, Amsterdam, Roma, Nova York, Buenos Aires, Montevidéu e México. Conquistou medalha de ouro através do quadro “Mulata Desnuda”, tema preferido por seus admiradores, onde “— a mais loura brasileira é a minha mulata metafísica…”
Sensualidade, arte barroca, erotismo, religiosidade, mulheres, cubismo, festas populares, samba e carnaval, burguesia, pescadores, natureza morta, folclore, flores, mar, impressionismo, paisagens, maternidade misturando-se a caricaturas, charges, portraits, paineis, murais, cenários e ilustrações.
Pintou em 1929 para o Teatro João Caetano “Samba e Carnaval”, considerados os primeiros painéis modernistas da América Latina.
Escritor, Jornalista e Poeta publicou “Viagem da Minha Vida” e “Reminiscências Líricas de um Perfeito Carioca”. Crónicas sobre suas vivências correram mundo. Como pintor, conquistou entre outros o prêmio de Melhor Pintor Nacional na II Bienal de São Paulo, recebeu o 1ro Prêmio na Mostra Internacional de Arte Sacra de Trieste, pelo quadro “Crucificação” adquirido pelo Instituto de Arte Litúrgica de Roma, Medalha de Ouro na II Bienal Interamericana do México e Prêmio Critica de Arte em 1971, por ocasião da Retrospectiva no Museu de Arte Modema de São Paulo.
Suas obras espalham-se em Museus e coleções particulares por toda América Latina, Estados Unidos e Europa, destacando-se os quadros “Família” Museu de Arte de Montevidéu, “Scene Brésilienne” Museu de Arte Modema de Paris, “Via Sacra” Catedral de Brasília, “Cinco Moças de Guaratinguetá” Museu de Arte de São Paulo, “Ciganos” e o tríptico “Navio Negreiro” no Museu Nacional de Belas Artes e “seu Ateliê e Obra Inacabada” permanecem no Museu de Arte Moderna de São Paulo, doados após sua morte em 26 de outubro de 1976.
— “Criar é acima de tudo dar substância ideal ao que existe.”
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